O thriller mais sombrio de Joel Schumacher continua a perturbar, 25 anos depois

Há filmes que se recusam a oferecer conforto. 8MM (1999), realizado por Joel Schumacher, Ă© um desses casos. Num mundo cinematográfico cheio de herĂłis bem-intencionados e finais redentores, esta descida aos porões da pornografia violenta e do voyeurismo doentio mantĂ©m-se como uma das propostas mais incĂłmodas do final do sĂ©culo XX.

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Protagonizado por Nicolas Cage num registo contido e melancĂłlico, o filme apresenta-nos Tom Welles, um detective privado aparentemente banal, casado, pai de famĂ­lia, e especialista em investigações discretas para clientes ricos. Mas tudo muda quando Ă© contratado para verificar a autenticidade de um rolo de pelĂ­cula 8mm onde, alegadamente, uma jovem mulher Ă© assassinada num “snuff movie”. O que parecia um caso de rotina transforma-se rapidamente numa viagem aterradora aos meandros mais grotescos da indĂşstria pornográfica underground.


Uma viagem sem retorno

A estrutura do filme assemelha-se a uma espiral: cada pista leva Welles mais fundo num mundo de predadores, vĂ­timas e silĂŞncios cĂşmplices. Joaquin Phoenix Ă© a companhia perfeita nesta jornada, interpretando Max California, um empregado de videoclube sarcástico e resiliente, que guia Welles por este submundo depravado com doses equilibradas de humor negro e humanidade.

Schumacher opta por uma realização fria e claustrofóbica, onde a luz é rarefeita e o moralismo está ausente. O ambiente visual é carregado, opressivo, como se o próprio espectador estivesse a perder a inocência a par do protagonista. O ritmo lento serve a construção da tensão: quanto mais Welles investiga, mais se aproxima da sua própria ruína emocional.


Verdade ou exploração?

8MM foi fortemente criticado Ă  Ă©poca pela sua temática — nĂŁo apenas por expor o tema dos “snuff films”, mas por sugerir que o horror Ă©, muitas vezes, alimentado pela nossa prĂłpria curiosidade. A fronteira entre justiça e vingança, entre investigação e obsessĂŁo, torna-se cada vez mais tĂ©nue.

O argumento de Andrew Kevin Walker (que escreveu Seven) coloca perguntas difĂ­ceis: atĂ© onde estamos dispostos a ir para descobrir a verdade? E depois de a vermos, conseguiremos alguma vez voltar ao que Ă©ramos?

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Um thriller imperfeito, mas necessário

Se 8MM nĂŁo Ă© um filme fácil, tambĂ©m nunca pretende sĂŞ-lo. É um thriller sombrio, pessimista, e por vezes mesmo sensacionalista, mas levanta questões legĂ­timas sobre o consumo de violĂŞncia, o voyeurismo moderno e o custo humano da justiça. Nicolas Cage, num papel que lhe exige contenção e fĂşria controlada, está em sintonia com o desconforto que o filme provoca.

Passados 25 anos, continua a ser um tĂ­tulo que desafia o espectador — a perguntar-se onde acaba o olhar e começa a cumplicidade. E isso, num mundo que ainda consome sofrimento como entretenimento, talvez faça de 8MM um filme mais actual do que nunca.

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