
Entre o machismo da NASA e o silêncio imposto pela homofobia, o novo documentário da Disney+ revela a coragem íntima de Sally Ride — pioneira no espaço e na vida
ver também : Maria de Medeiros Triunfa no México: Festival de Guadalajara Rende-se ao Talento Português
Em 1983, milhões de olhos seguiram o lançamento do vaivém espacial Challenger, com um detalhe histórico: entre os astronautas estava, pela primeira vez, uma mulher norte-americana. Sally Ride, física brilhante e reservada, foi catapultada para o estrelato como símbolo de progresso e inspiração para uma geração de jovens raparigas. Mas o que não se sabia — e o novo documentário Sally revela com crueza e ternura — é que por trás do sorriso público estava uma luta silenciosa contra o machismo institucional… e a homofobia.
O filme, que se estreia a 17 de Junho no Disney+ Portugal, chega num momento de particular tensão política e cultural. Realizado por Cristina Costantini (Mucho Mucho Amor), Sally é uma homenagem sentida e necessária à coragem em todas as suas formas — e a um tipo de heroína que a História tantas vezes silenciou.

“Fiz este filme para quem já teve de esconder parte de si”
Em entrevista à agência Lusa, Cristina Costantini não esconde a motivação pessoal por trás do projecto: “Fiz este filme para qualquer pessoa que já teve de esconder ou mudar parte de si para seguir os seus sonhos.” E completa: “Penso que essa é, tristemente, uma experiência mais relevante que nunca em 2025.”
Mais do que um simples retrato biográfico, Sally mergulha fundo nas contradições da era em que a NASA finalmente abriu as portas às mulheres… mas ainda não estava preparada para as receber como iguais. A agência chegou ao ponto de preparar um “kit de maquilhagem espacial” e questionar se 100 tampões seriam suficientes para seis dias no espaço — enquanto os media perguntavam se Sally ia chorar em órbita.
E, no entanto, sob essa pressão, Ride destacou-se. Brilhante, discreta, profissional ao mais alto nível. E ainda assim, durante toda a sua vida, escondeu uma parte essencial de si: a sua relação com Tam O’Shaughnessy, companheira durante 27 anos.
Uma vida dividida entre a ciência e o silêncio
Sally Ride morreu em 2012, vítima de cancro, aos 61 anos. Foi apenas no seu obituário que o mundo soube que deixava uma parceira. Até então, apenas familiares e amigos próximos sabiam da sua orientação sexual. Foi Tam quem insistiu que a verdade fosse finalmente dita — porque, como afirma no documentário, “a história não estava completa”.
O filme dá palco a Tam O’Shaughnessy, que partilha memórias íntimas, momentos de cumplicidade e frustrações silenciosas. Quando Barack Obama distinguiu Sally Ride com a Medalha Presidencial da Liberdade, foi Tam quem a recebeu. Três anos depois, o casamento entre pessoas do mesmo sexo foi legalizado nos EUA. Mas Tam, hoje, está menos optimista.
“É uma batalha humana permanente e temos de continuar a esforçar-nos pelos valores que são importantes”, afirma, lembrando os recentes retrocessos nos direitos LGBT, tanto nos EUA como noutros países. “É um momento horrível e assustador”.
Quando até a bandeira do arco-íris incomoda
O contexto de Sally tornou-se involuntariamente profético. A realizadora começou a trabalhar com o canal National Geographic e a produtora Story Syndicate sem imaginar que o lançamento coincidiria com ataques directos às políticas de diversidade e inclusão. A própria NASA foi recentemente forçada a remover bandeiras do Orgulho Gay das suas instalações.
“Não fazíamos ideia de que seria lançado num momento em que a DEI está sob ataque”, lamenta Cristina. Mas talvez por isso mesmo, o documentário se torne ainda mais urgente.
Foi ao descobrir que Sally teve uma parceira que a realizadora sentiu o clique criativo: “Pensei: Se a NASA mal estava preparada para mulheres, como terá sido amar uma mulher naquele ambiente?”
Precisamos de mais Sallys. E de mais Tams.
Sally não é apenas um tributo à primeira mulher americana no espaço. É um lembrete do preço que tantas pessoas pagaram — e ainda pagam — por serem quem são. E é, acima de tudo, uma história de amor, de resiliência, e de esperança.
ver também : Jacinda Ardern Vira Documentário: Quando Liderar com Empatia é um Acto Revolucionário
A estreia está marcada para 17 de Junho no Disney+ e 21 de Junho no canal National Geographic. Se há um momento para conhecer esta história, é agora.
No comment yet, add your voice below!